A
mitra (do
grego μίτρα: cinta, faixa para a cabeça, diadema) é uma insígnia
pontifical utilizada pelos prelados da
Igreja Católica, da
Igreja Ortodoxa e da
Igreja Anglicana, sejam eles: abades, bispos, arcebispos,
cardeais ou mesmo o
Papa. A mitra é a cobertura de cabeça prelatícia de cerimônia.
Simbolismo
A mitra usada pelo bispo simboliza um capacete de defesa que deve tornar o
prelado
terrível aos adversários da verdade. Por isso, apenas aos bispos, salvo
por especial delegação, cabe a imposição do Espírito Santo no
sacramento do Crisma ou Confirmação.
Definição
A mitra é um tipo de cobertura de cabeça fendida, consistindo de duas
peças rígidas, de formato aproximadamente pentagonal, terminadas em
ponta, por isso, às vezes chamadas
corno ou
cúspides,
costuradas pelos lados e unidas por cima por um tecido, podendo ser
dobradas conjuntamente. As duas cúspides superiores são livres e na
parte inferior forma-se um espaço que permite vesti-la na cabeça.
Há duas faixas franjadas na parte posterior, chamadas
ínfulas, que descem até as
espáduas. Na teoria, a mitra sempre é supostamente branca.
História
A mitra pontifical é da origem
romana, sendo derivada de uma cobertura de cabeça não litúrgica, exclusiva do papa, o
camelauco, do qual também teve origem a
tiara. O
camelauco era usado antes do
século VIII, como se relata na biografia do
Papa Constantino, no “Liber Pontificalis”. O nono ‘’Ordo’’ indica que o
camelauco era confeccionado de um material branco e tinha a forma de um capacete. As moedas dos papas
Sérgio III e
Bento VII, em que
São Pedro usava um
camelauco, dão a este a forma de um
cone, que é a forma original da mitra. O
camelauco foi usado pelos
papas principalmente durante as procissões solenes. A mitra evoluiu do
camelauco, no curso do décimo
século X,
quando o papa começou a usar a mitra durante procissões à igreja e
também durante o serviço religioso subseqüente. Não se pode afirmar que
tenha havido alguma influência do ornamento de cabeça sacerdotal do sumo
sacerdote do
Antigo Testamento.
Foi só após a mitra estar sendo universalmente usada pelos bispos, é
que se levantou a hipótese dela ser uma imitação da cobertura de cabeça
sacerdotal judaica.
Janice Bennett, em seu livro “Sacred Blood, sacred Image” , cita uma tradição seguida por
Tadeu de Edessa, de que no
cristianismo, a mitra desenvolveu-se a partir da prática de
São Pedro colocar o
Sudário em sua própria cabeça, como símbolo de um ministério curativo. Tal fato não encontra nenhum respaldo
histórico ou
teológico.
Desde o
século XVII tem se escrito muito sobre em que tempo a mitra começou a ser usada na
liturgia. Alguns autores crêem que seu uso é anterior aos tempos
apostólicos, portanto anterior ao
cristianismo. Segundo outros, remonta aos séculos
VIII ou
IX. E uma terceira corrente afirma que ela surgiu por volta do início do
segundo milênio, sendo que antes era usado um ornamento para a cabeça na forma de grinalda ou coroa.
O certo é que um ornamento episcopal para a cabeça, na forma de uma
faixa, nunca existiu em Europa ocidental, e que a mitra foi usada
primeiramente em
Roma por volta da metade do
século X, e fora de
Roma no ano
1000.
A prova Exaustiva para isto é dada no trabalho "Die liturgische
Gewandung im Occident und Orient" (pp. 431-48), onde todas as teorias da
origem da mitra são estudadas. A mitra é descrita para a primeira vez
em duas miniaturas do começo do
século XI; uma destas miniaturas está em um registro batismal, a outra num pergaminho do
Exultet, da catedral de
Bari,
Itália. A primeira referência escrita sobre a mitra é encontrada numa
bula de
1049, do
Papa Leão IX. Nesta o papa, que tinha sido anteriormente bispo de
Toul, na
França, confirmou a primazia da igreja de
Tréveris ao bispo Eberardo de
Tréveris, anteriormente seu metropolita que o tinha acompanhado a
Roma. Como um sinal desta primazia, o
Leão IX
concedeu ao bispo Eberardo a mitra romana, a fim de que pudesse a usar
de acordo com o costume romano, ao executar os ofícios da igreja. Pelos
anos
1100 a
1150, o uso da mitra já havia se generalizado entre os bispos.
Os
cardeais já usavam a mitra no fim do
século XI, provavelmente tendo adquirido este direito na primeira metade daquele século.
Leão IX concedeu este privilégio aos
cônegos da
catedral de
Besançon, em
1051. Os
cardeais, certamente, gozaram deste privilégio, anteriormente a esta data. A primeira concessão de uma mitra a um
abade data do ano
1063, quando o
Papa Alexandre II concedeu a mitra ao abade
Egelsino, na
Abadia de Santo Agostinho, em
Cantuária. Desde então as concessões aos
abades foram aumentando até se generalizarem.
Também aos
príncipes cristãos foi concedida, às vezes, a permissão usar a mitra, como uma marca da distinção; por exemplo, o
Duque Wratislaw, na
Boêmia recebeu este privilégio do
Papa Alexandre II;
Pedro de Aragão recebeu de
Inocêncio III. O
imperador alemão também gozou deste direito.
Forma
Mitra estilo simples tradicional: branco com damasco seus babados brancos terminando em franjas vermelhas.
Considerando a forma, há tal diferença entre a mitra do
século XI
e a mitra atual que, por vezes, é difícil reconhecer serem as duas a
mesma peça litúrgica.. Na sua forma mais antiga, a mitra era uma
cobertura simples, de material macio, que terminava acima numa ponta;
tendo geralmente, mas não sempre, em torno da borda mais baixa, uma
faixa ornamental (circulus). Parece também que as
ínfulas não estiveram sempre unidas à parte traseira da mitra. Por volta do ano
1100,
a mitra começou a ter uma forma curvada para cima, tomando forma de um
barrete redondo. Em muitos casos apareceu logo um depressão, na parte
superior similar a essa que é feita quando um chapéu de feltro macio é
pressionado para baixo na cabeça, forçando-o na testa e na parte de trás
da cabeça. Em diversas mitras, uma faixa ornamental passou da parte
dianteira à parte traseira através do recorte; isto fêz mais proeminente
as cúspides, na parte superior das lâminas, dos lados direito e
esquerdo da cabeça. Esta mitra em forma de calota foi usada até tarde,
atingindo o início do
século XII; e, em alguns lugares, até o último quarto
deste século.
Por volta de
1125,
uma mitra de um outro formato e aparência um tanto diferente é
freqüentemente encontrada. Nela as abas nos lados tinham-se tornado
chifres (cornua), que terminavam, cada um, em uma ponta, tendo sido
endurecidos com
pergaminho
ou alguma outra intertela. Esta mitra forneceu a forma de transição ao
terceiro estilo, que é essencialmente o da mitra usada ainda hoje. A
terceira mitra é distinta de sua predecessora, não realmente por sua
forma, mas somente por sua posição na cabeça. Ao manter sua forma, a
mitra foi, desde então, colocada na cabeça com os cornos já não acima da
região temporal, mas acima da testa e da parte traseira da cabeça. As
ínfulas
tiveram, naturalmente, que ser prendidos na borda inferior abaixo do
corno da parte traseira. O primeiro exemplo de tal mitra apareceu por
volta de
1150.
As mitras elaboradas desta forma tiveram não somente uma faixa
ornamental (circulus) na borda mais baixa, mas uma faixa ornamental
similar (titulus), que foi verticalmente aplicada sobre o meio dos
cornos. No
século XIV,
esta forma de mitra começou a ser distorcida. Até então, a mitra tinha
sido um tanto mais larga do que elevada, quando dobrado, mas neste
período nela começou, lentamente, mas firmemente, ter a sua altura
aumentada; até que, no
século XVII, cresceu como uma torre real. Uma outra mudança, que surgiu no
século XV, foi que os lados já não eram feitos na vertical, mas na diagonal. No
século XVI,
começou a ser habitual curvar-se, com mais ou menos intensidade, os
lados diagonais dos cornos. A ilustração dá um sumário do
desenvolvimento da forma da mitra..
Estas as mudanças não ocorreram em toda parte, ao mesmo tempo, nem a
mitra teve todas as formas do desenvolvimento, em todos os lugares. Um
grande número mitras do início da
Idade Média
foram preservadas, mas todas pertencem á terceira forma. Muitas têm
ornamentação riquíssima, sendo costume ornamentar as mitras com
bordados, faixas ricas (aurifrisia), pérolas, pedras preciosas, pequenos
discos ornamentais de metais preciosos; e fazê-las planas, para receber
pinturas. Uma mitra medieval do início da igreja de São Pedro, em
Salsburgo além de estar ornamentada com cem
pérolas
, apresenta cerca de quinhentas pedras preciosas, pesando cerca de
cinco libras e meia. Outras mitras similares são mencionadas também no
inventário de
1295 de
Bonifácio VIII. Oito mitras
medievais são o preservadas na
catedral de
Halberstadt. Nos séculos
XVII e
XVIII, as mitra passaram a ser ornamentadas com bordados ricos, de fios de
ouro, o que lhe deu uma aparência mais imponente. Uma mitra do
século XVIII preservada no
tesouro da
catedral em
Limburgo
é notável pelo grande número de pedras preciosas que a adornam. O
material original da mitra parece ter sido apenas linho branco, mas a
partir do
século XIII (à excecção do curso da mitra simples), geralmente foi feita de seda ou ornamentada com bordados de seda.
Tipos
O cerimonial distingue dois tipos de mitras
- A Ornada quando é guarnecida de adornos, mais ou menos ricos. As mitras ornadas se dividem em:
- Preciosa (Pretiosa): é decorada com pedras preciosas e ouro
- Aurifrisada (Auriphrygiata): é de tecido liso de ouro ou de seda branca bordada a ouro e prata
- Faixada: com duas faixas ornamentais ou galões, uma
(circulus) na borda mais baixa, e outra (titulus) em posição vertical,
no meio de cada pala ou corno.
- A Simples é inteiramente de tecido branco, interna e externamente, sem ornamentos, nem mesmo nas ínfulas, que portam franjas vermelhas. Ela será de linho para os bispos e de seda adamascada branca apenas para os cardeais.
Papa
Tradicionalmente, o
papa, conforme a circunstância, serve-se de três tipos de mitra:
- A Gloriosa: ornada de pedras preciosas e de um círculo de ouro que
lhe forma a base. (Nesta categoria está inclusa a mitra com a tripla
faixa dourada).
- A Preciosa: ricamente decorada, mas sem o círculo da base.
- A Argêntea: de lhama de prata, correspondente à mitra simples dos bispos.
No caso do Papa, a mitra pode ter o formato de uma coroa tripla, sendo, neste caso, chamada de
tiara papal ou "triregnum". O uso da
tiara papal foi abandonado, mas não abolido, pelo
Papa Paulo VI, que adotou a mitra comum, com a intenção de enfatizar mais o caráter pastoral do que temporal da autoridade pontifícia.
Uso
O "Cerimonial dos Bispos" manda que a mitra, o
anel episcopal e o
báculo sejam abençoados antes da
ordenação episcopal
de quem o deva receber; sendo que a primeira imposição deve ser feita
apenas durante o rito da ordenação. Antes das celebrações litúrgicas,
deve sempre ser um
diácono quem impõe a mitra no
bispo.
Pelas normas litúrgicas atuais, a mitra deve sempre ser uma só na mesma ação
litúrgica.
A mitra preciosa é usada nas celebrações mais solenes. A aurifrisada é
usada no advento, na administração dos sacramentos, e nas “memórias”. A
faixada, nos dias comuns. A mitra simples usa-se na “Quarta-Feira de
Cinzas”, na “Sexta-Feira Santa”, no dia de “Finados”, nas “Assembléias
Quaresmais”, no rito da “Inscrição do Nome”, na solene celebração do
sacramento da
Penitência, na celebração de
Exéquias e quando um
bispo
concelebrar com outros, não sendo ele o celebrante principal. Portanto,
nas concelebrações, somente o celebrante principal pode usar a mitra
ornada.
O direito de usar a mitra pertence somente ao
papa, aos
cardeais, aos
bispos e
abades. Porém houve alguns privilégios a prelados menores como dignitários de
cabidos, prelados da
Cúria Romana, e
Protonotários Apostólicos, porém este uso era bem limitado. A mitra chegou a ser permitida ainda às
abadessas de
mosteiros femininos.
A mitra é distinta de outras insígnias e sempre é retirada quando o
bispo está rezando, em decorrência do preceito apostólico do
homem sempre rezar com a cabeça descoberta (1ª
Cor 11, 14).
Na
ordenação de um
bispo ele recebe primeiro o livro do
Evangelho, depois o
anel episcopal, a mitra e por último o
báculo.
Pelas leis
litúrgicas a mitra é usada pelo
bispo, sobre o
solidéu, quando se dirige ou retorna, processionalmente, para alguma função sagrada; quando está sentado; quando faz
homilia; quando faz saudações; locuções e avisos; quando dá a bênção solene; e quando faz gestos sacramentais. O
bispo não usa a mitra: nas preces introdutórias; nas orações; na “Oração Universal”; na “Oração Eucarística”; durante a leitura do
Evangelho; nos hinos, quando estes são cantados de pé; nas procissões em que leva o
Santíssimo Sacramento, ou as relíquias da
Santo Lenho; e diante do
Santíssimo Sacramento exposto.
A mitra no rito Grego Ortodoxo
No
rito grego Ortodoxo não se usou uma cobertura de cabeça
litúrgica até o
século XVI. Antes disto, somente o
Patriarca de
Alexandria, usou desde o princípio do
século X,
uma cobertura litúrgica para a cabeça, a qual era um simples A mitra
pontifical grega é uma cobertura de cabeça elevada com uma dilatação
para fora , no alto, que se expande diagonalmente em dois arcos; no
ápice há uma cruz em relevo ou achatada. Ela é baseada na coroa imperial
fechada do período tardio do
Império Bizantino. Conseqüentemente, é baseada também no
camelauco, embora divirja muito dele, posto que se desenvolveu com elementos adicionais. Tem, pois forma de
coroa bulbosa, decorada com
brocados e ricas
jóias.
Como uma
insígnia imperial, tal qual o
sakkos ou a
dalmática imperial, significa a autoridade temporal dos
bispos, especialmente do
Patriarca de
Constantinopla, dentro da administração da comunidade Cristão, no
Império Otomano.
Cristianismo Oriental
Mitra dourada do Patriarca Maxim da Bulgária
Nas
Igrejas Católicas Orientais o uso da mitra é prerrogativa dos bispos, mas pode ser concedida aos
arciprestes, aos
protopresbíteros e
arquimandritas. A mitra
prebiteral não é sobreposta pela cruz e é concedida por determinação de um
sínodo.
Os bispos ortodoxos orientais usam, às vezes, mitras do estilo ocidental ou oriental. No passado, os bispos
coptas usaram o
ballin, um
omofório enrolado em torno da cabeça como um
turbante. Os bispos ortodoxos da
Síria usam o
masnafto
(maşnaphto), literalmente “turbante”) ao presidir a Liturgia. Esta é
uma capa grande, rica e bordada freqüentemente com a uma imagem do
Espírito Santo, em forma de
pomba. Os
padres ortodoxos
armênios usam mitras bizantinas, enquanto seus bispos usam mitras ocidentais.
Igreja Anglicana
O uso da mitra foi abandonado na
Igreja Anglicana, após a
Reforma de
Henrique VIII, mas foi re-introduzida no princípio, em conseqüência do chamado
Movimento de Oxford, sendo atualmente usada pela maioria dos bispos
anglicanos.
Heráldica
A mitra foi suprimida dos
brasões de armas dos bispos
católicos, em
1969, sendo mantida nos
brasões das
dioceses.
Nos brasões
anglicanos a mitra sempre esteve presente como timbre.
As
ínfulas são descritas com forro vermelho.
O
Papa Bento XVI , por influência por do
heraldista Monsenhor
Andréa Cordero Lanza de Montezemolo (depois criado
cardeal), retirou a
tiara
de seu brasão, substituindo-a por uma mitra de prata com três traços
dourados (numa referência às três coroas da tiara). Esta atitude de
Montezemolo gerou crítica em todas as instituições heráldicas do mundo,
que dentre as muitas argumentações, a principal evocada é a de que a
Heráldica tem leis seculares e fixas. A
Sociedade Americana de Heráldica chegou a sugerir que Montezemolo utilizasse pelo menos o
camelauco no brasão papal.
Fonte: Wikipedia